sábado, 15 de fevereiro de 2014

Passe adiante





Ouvi em silêncio seu soluçar, e vi igualmente neste idioma sem palavras as suas lágrimas. Senti-lhe quando o lápis grifava-me revelando o melhor de mim, cócegas que carregarei para sempre, maneira de me completar e me escrever em si. Mas era chegado o momento inevitável da separação, meu destino. Devo partir. Sei porém, pelo sabor da lágrima a me banhar, que estarei sempre com ele, pedaço de felicidade que carrego comigo até encontrar um novo amigo.

Fechei-o com uma felicidade imensa e real que me transbordava. Precisava retribuir os momentos bons que passamos juntos, por isso, deixei-o disponível sobre o banco vazio do ônibus. Separações são sempre difíceis, eu sei, mas era o mínimo que poderia fazer: permitir que ele viajasse outras pessoas, sua maior alegria.

Por um instante a solidão causou-lhe medo. E se ninguém o encontrasse? E se fosse parar num daqueles achados e perdidos da vida, sem o calor de uma mão a folhear-lhe, de olhos a devorar-lhe cada palavra? 

De fato, foi realmente parar numa sala fria junto com tantos outros objetos que perderam a identidade e viu durante muito tempo muitos deles desaparecem. Até que uma jovem de olhos assustados o pegou e escondeu-o apressadamente em sua bolsa. Mas essa é uma outra história e terá de ser contada em outra ocasião.


(crédito da imagem: http://www.comicforum.de/showthread.php?48121-Scribble-Sammelthread/page512)

4 comentários:

Unknown disse...

Que bonito, singelo

Vinícius disse...

belíssimo!

Unknown disse...

Ansiosa para a continuação a ser contada em outra ocasião. Lindo texto!

Ruan disse...

Queria eu, estar presente, para poder guarda-lo em meu sangue, em meu coração