quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Hoje

Hoje deixo as palavras por conta própria
elas não precisam de mim
do trato e do carinho que ofereço

deixo
e vou ao encontro dos meus
no barracão
no busão
no vagão
lotados
de sonhos que forram a terra
cobrem o teto
seguram-se em barras
                     paralelas
e nadam em rio sem vida

daqueles que tornam a luta
gesto maior que um pronome
mão quente acariciando o rosto
atravessando a madrugada fria

hoje sou mais um e vou
na multidão
dos que me tornam palavra
e concedem-me este carinhoso gesto solidário

vou e converto-me em poesia de luta
que, mesmo sob a eterna falta do poeta
concretiza-se
em lona, canção, cadeia
dia-a-dia.


sábado, 9 de novembro de 2013

Montauk

Deu branco, se diz do que não lembra
palavras esquecidas (canções de ninar ao telefone)
choro entalado

Nuvens em céu claro: brancas
é o futuro que passa sem cair no chão
chuva dissipada pelos raios - brancos - do sol

Branco de roupas no varal
longínquas tardes em praça inventada
amizade aquecida pelo abraço alvo do tempo

Areia branca de neve em Montauk
sons espumosos no mar
vento acompanhando o amanhecer

set-light redondo sobre o rosto: branco
segundo-plano desfocado
ninguém vê o que se perde

Branco, fade-out demorado
prenúncio do fim ou de uma nova sequência
expectativa dentro do vaso vazio.

Enfim, branco da memória
luz dura incidindo sobre a cabeça
e o mundo todo é azul.

Carrego-as assim, as lembranças:
talhadas em geleiras eternas
brancas, alvas lacunas.