sábado, 13 de maio de 2017

Teu silêncio

"Estou absolutamente cansado de literatura; só a mudez me faz companhia. Se ainda escrevo é porque nada mais tenho a fazer no mundo enquanto espero a morte. A procura da palavra no escuro."
In: A hora da estrela -  Clarice Lispector



O eco que me rouba a madrugada. A voz nas cavernas da memória. O abraço que me prende à cama. O vazio da cama. O murmúrio do chuveiro. O azulejo frio. A roupa que me veste. O sapato amarelo que me guia. Bate como fome. Como a falta de fome. Como o amargo do café.

Acompanha-me como sombra. A canção que se repete. Um refrão clichê. Um vagão cheio de ninguém. O peso a menos na balança. Um peso a menos na carteira. Duas notas de cinquenta. O excesso de horas vadias. Anda como quem esqueceu pra onde vai. Corre nas aulas e nas salas de cinema.

O meu grito. A palavra que me corta. Que me sobe à garganta. A prosa mal escrita. O verso que não sai. Um poema de João Cabral. O Gigante Adamastor. A solidão de terno azul. O estalo do gatilho. Perfura as noites e os dias e os meses. Incansável. Arrasta-se como lesma. O rastro de gosma da lesma. A busca. A espera. O vácuo.

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