(poema-crônica inspirado em cena da peça O errante, da Brava Cia.)
o lado de lá gosta de associar
em metonímico processo
o verde, às florestas;
o amarelo, às riquezas;
o azul, ao céu anil;
e a faixa branca é a corrente do
progresso.
acreditam que assim nascemos nação
eis, porém, que uma dúvida surge:
e o vermelho do sangue indígena
cobrindo o chão paulista
pintado por bandeirantes?
do sangue grudado
nos filhos nascidos
de violações?
do corte das árvores, do corte das orelhas
do corte dos laços com a terra-mãe?
o sangue das costas
depois de açoitada
a pele negra -
que escorre pelo dorso, pelo tronco, pelo barro batido?
o sangue que desceu pelo litoral
vindo do norte
pra levantar essa cidade?
o sangue que ainda corre nos morros
muros, favelas, becos e bares?
quando a paulista vestiu verdeamarelo
o sinal vermelho acendeu em meu olho.
do lado de cá andamos dispersos.
se é verdade que falta uma bandeira que nos
una
não tenhamos dúvidas de qual será sua cor
nem da mão com que iremos empunhá-la.